domingo, 27 de julho de 2014

Novas ‘esperanças’

Mais uma vez, publico aqui uma das minhas crónicas do Diário do Distrito.
Não, ainda não desisti de ir usando este espaço para os meus desabafos, mas por vezes o tempo, a vontade, e pronto, admito, o facebook, não deixam espaço para, perdoem-me a redundância, este espaço.
Portanto cá fica mais um dos meus textos, desta feita dedicado aos jovens que se iniciam nesta que para mim é a melhor e a pior das profissões.
 
Tenho falado neste cantinho de algumas pessoas com quem me cruzei nesta vida cigana de jornalista, sobretudo dos profissionais, e mais ainda dos pseudo-profissionais.
Mas há também os «miúdos» como são conhecidos, jovens na sua maioria que terminaram os cursos de jornalismo e procuram um lugar na profissão que tanto desejam (ou que pensam gostar).
Uma das coisas que sempre gostei foi de trabalhar com estagiários, os «miúdos».
Primeiro, porque gosto de ensinar, gosto de passar dicas e algumas (muitas) das minhas histórias. Mas, sobretudo, gosto de ver a evolução e o nascer de um novo jornalista, o interesse crescente por uma área que, muitas vezes, se prova ser totalmente diferente do que esperavam.
Muitas das vezes bastam apenas alguns dias para conseguir detectar se aquele estagiário pode vir ou não a ser um bom jornalista. E também nunca deixei de o dizer a um ou outro que trabalhou comigo, e que procurou esta profissão porque achava que era interessante dizer aos amigos que estava a estudar Jornalismo, ou porque os amigos até lhe diziam que escrevia umas poesias engraçadas.
Jornalismo não é uma profissão de horários nem para fracos, é uma profissão que exige tudo de nós, e raramente nos dá algumas daquelas coisas que muita gente procura: a fama e o sucesso.
Posso mesmo dizer que, antes pelo contrário, a maior parte das vezes apenas nos cria inimigos, nos afasta da família e até leva a que nos apontem como párias.
E também é preciso saber lidar com isso. Como é preciso saber lidar com pessoas nas entrevistas, lidar com situações de stress ou até saber como estar num jantar ou almoço de trabalho.
É isso que tento incutir nos tais «miúdos» que comigo têm trabalhado, acima de tudo porque são raríssimos os cursos universitários que tocam sequer ao de leve todos estes temas.
E por isso não posso deixar de apontar o dedo para alguns cursos que vão abrindo nas Universidades e que atraem esses jovens, e sobretudo o dinheiro dos pais, para cursos que de jornalismo só têm o nome.
Sim, alguns até poderão ter alguns bons professores a dar uma ou duas cadeiras realmente úteis, mas levarem quatro anos a estudar Roland Barthes, Auguste Comte e outros, pode ser muito interessante, mas não se aplica ao dia-a-dia numa redacção, onde o que realmente interessa é o «onde, quando e porquê».
Recentemente trabalhei com um estagiário que estava ainda a tirar o curso e qual não foi o meu espanto quando ele me disse que o trabalho final seria a elaboração de uma entrevista. Claro que quando terminou o curso, já tinha feito comigo e sozinho, várias entrevistas e, após isso, achou também um pouco ridículo o tal trabalho final.
Claro que nem todos os alunos de jornalismo podem aspirar a trabalhar num jornal ou televisão durante o curso e também não se pode esperar que no final de uma licenciatura em jornalismo, um aluno saiba fazer um jornal inteiramente sozinho.
Mas que o trabalho final de quatro anos de estudos se limite a uma entrevista?
Sobre este assunto, toco ainda nos jornalinhos (locais e nacionais), bem como televisões, que adoram trabalhar com esta mão-de-obra barata e por vezes praticamente à borla, apesar das alterações legislativas e dos apoios que os sucessivos Governos gostam de prometer.
Quando digo trabalhar, é enfiar um microfone ou um gravador nas mãos e mandar fazer a notícia ou a reportagem. Que nesses casos raramente sai alguma coisa de jeito, mas o que interessa muitas vezes são as gordas que se colocam nas capas, mesmo que depois o conteúdo nada tenha a ver, ou seja uma tal salganhada que nos leva a desistir de ler.
Antigamente, muitos estagiários entravam para grandes órgãos de comunicação social e ficava largos dias a servir cafés ou a tirar fotocópias, apanhando umas migalhas de informação pelos intervalos, mas agora, esses mesmos órgãos optam por aproveitar essa mão-de-obra barata para realizar o trabalho dos jornalistas profissionais, mesmo que mal saibam compor uma notícia. E por isso temos muita informação que, ‘espremida’ não vale o papel em que foi impressa. Não por culpa de quem a escreveu, mas por culpa de quem acha que para um jornal qualquer junção de palavras basta. E se for feita gratuitamente, melhor ainda.