No outro dia conversava com uma amiga sobre os desastres
que já me aconteceram desde que o ano novo começou. Computadores avariados, a
morte de uma gata, inundação na redacção, etc e muito tal.
Claro que contava-lhe tudo no meu tom de voz normal, ou
seja, vários decibéis acima do tom de voz de uma pessoa normal.
Depois de me pedir para baixar o tom de voz, fazendo ela
o mesmo, pediu-me para respirar. Simplesmente respirar. E sentir o ar entrar
para os pulmões e o oxigénio fazer todo o seu circuito.
«Agora podes continuar», disse-me ela.
E continuei, mais calma, respirando, e até vendo alguma
ironia em tudo o que se tinha passado.
Quando acabei, esta amiga disse-me: «já paras-te para pensar
que se não te tem acontecido isso, podia ter-te acontecido algo pior?».
«O quê? Bater com o carro, morrer-me um familiar?»
«Não. Mas se o computador não te tem avariado, se calhar
ficava estragado na inundação. E se a Mimi não tem morrido assim de repente,
estaria em sofrimento e tu também.»
Confesso que sou uma fatalista e pessimista ferrenha.
Se algo me cai ao chão, é o Universo que se coloca contra
mim.
Se perco as chaves de casa (pelo menos duas vezes ao dia) é a bruxa de
serviço que me está a irritar. Aliás, a minha frase favorita quando tudo isto
me acontece é «Não vale a pena!!!!!!!!!»
Mas estas palavras fizeram-me pensar. Vale a pena
irritarmo-nos por coisas pequenas? Será que ao vermos o pequeno e o demasiado
próximo, não conseguimos espaço para ver o maior e mais ao longe?
Confesso também que não sou dada a essas coisas de
esoterismo, do «aconteceu porque tinha de ser», talvez porque se há algo que nunca
fui, é conformista. Acredito que o destino somos nós que o fazemos, que o karma
é um nome giro para um gato e que se queremos que algo aconteça, temos de ser
nós a fazê-lo acontecer.
Gostaria de me conseguir entregar «nas asas do destino»,
mas não consigo. No entanto, apesar de não acreditar em coincidências, por
vezes é tempo de parar e repensar um bocado sobre as nossas prioridades no que
respeita a gastar as poucas energias que nos restam ao chegar aos quarenta
anos.
Se não tivesse encontrado gente como uma certa Violante
Assude há seis anos atrás, que fez com que fosse despedida da empresa onde
trabalhava, estaria hoje a ser patroa de mim mesma e a fazer o jornalismo regional
que adoro? Se não fosse parar a uma editora onde me usaram para fazer todas as
revistas que editavam, teria a estaleca profissional que tenho hoje? Se não me
tenho cruzado com certas pessoas e outras pessoazinhas, teria a visão que tenho
da vida que tenho hoje?
Um blogue de uma jornalista que já viu um pouco de tudo, usado para falar de qualquer coisa.
terça-feira, 28 de janeiro de 2014
sábado, 4 de janeiro de 2014
As Pálas
Primeiro que tudo, uma saudação a quem perde algum tempo
para ler o que escrevo, desejando que 2014 traga saúde e felicidade, já que
dinheiro será muito difícil.
Hoje escrevo sobre as pálas. Aquelas que muitas pessoas colocaram aos 12 ou 13 anos (outros um pouco mais tarde, consoante lhes deu mais jeito) e das quais não são capazes ou não querem livrar-se.
Se há algo que me irrita é isso. Nasci antes do 25 de Abril de 1974, e tive a sorte de ser «A Geração de Abril», os meninos que podiam ir para a escola sem bibe, que podiam pintar cravos e papoilas nos muros da escola, que podiam dizer a palavra liberdade sem medo.
Fui da juventude que podia ler o que quisesse, numa biblioteca recheada de livros. Que pôde ler sobre os horrores da PIDE e sobre a vitória de Humberto Delgado, porque o meu pai, simples pastor/cobrador/estivador conseguiu comprar esses livros.
Fui do sexo feminino que pôde decidir começar a trabalhar aos 17 anos, e desde aí nunca mais parar. Pude estudar na Universidade, no curso que quis.
Fui durante todos esses anos, educada numa família comunista. Numa família que se calava quando na televisão falava Álvaro Cunhal, figura que sempre respeitei. Numa família que seguia os resultados das eleições na sede do PCP da Torre da Marinha (local que alguns que hoje ostentam cravinhos vermelhos se calhar nem sabem que existiu).
Mas graças a um pai apenas com a 4ª classe e uma mãe que quase nem sabia assinar o seu nome, aprendi a pensar.
Aprendi a não ficar apenas pelo que ouvia, a indagar, a olhar o mundo com olhos de ver. Sem pálas.
Claro que essa visão se deve também ao muito que passei. Fui delegada sindical, defendi os direitos dos meus colegas, não em reuniões bacocas a debitar discursos políticos, mas no local, levando mesmo a uma paralisação numa secção da empresa onde trabalhava. A minha maior lição de vida. Porque se lutei por essas “colegas”, muitas delas são as que hoje passam por mim e fingem que não me viram. Mas tenho outras, que mesmo hoje varrendo as ruas, não deixam de me fazer uma enorme festa, que retribuo com a amizade que lhes devo.
Mas voltemos às pálas. Essas que alguns gostam de ostentar, e que lhes tira até o discernimento para uma discussão. As pálas que sempre me recusei a usar.
E por isso sou capaz de hoje, tanto defender como acusar. De agradecer e apontar o dedo. De aceitar e de recusar. E tenho um enorme orgulho disso a cada dia que passa.
Claro que não é fácil, num tipo de sociedade que só vive de rótulos, de cores políticas, de tendências, de gostos. Mas ser integro e vertical nunca foi fácil.
E nunca o será, enquanto a sociedade for composta na sua maioria por cordeiros.
Hoje escrevo sobre as pálas. Aquelas que muitas pessoas colocaram aos 12 ou 13 anos (outros um pouco mais tarde, consoante lhes deu mais jeito) e das quais não são capazes ou não querem livrar-se.
Se há algo que me irrita é isso. Nasci antes do 25 de Abril de 1974, e tive a sorte de ser «A Geração de Abril», os meninos que podiam ir para a escola sem bibe, que podiam pintar cravos e papoilas nos muros da escola, que podiam dizer a palavra liberdade sem medo.
Fui da juventude que podia ler o que quisesse, numa biblioteca recheada de livros. Que pôde ler sobre os horrores da PIDE e sobre a vitória de Humberto Delgado, porque o meu pai, simples pastor/cobrador/estivador conseguiu comprar esses livros.
Fui do sexo feminino que pôde decidir começar a trabalhar aos 17 anos, e desde aí nunca mais parar. Pude estudar na Universidade, no curso que quis.
Fui durante todos esses anos, educada numa família comunista. Numa família que se calava quando na televisão falava Álvaro Cunhal, figura que sempre respeitei. Numa família que seguia os resultados das eleições na sede do PCP da Torre da Marinha (local que alguns que hoje ostentam cravinhos vermelhos se calhar nem sabem que existiu).
Mas graças a um pai apenas com a 4ª classe e uma mãe que quase nem sabia assinar o seu nome, aprendi a pensar.
Aprendi a não ficar apenas pelo que ouvia, a indagar, a olhar o mundo com olhos de ver. Sem pálas.
Claro que essa visão se deve também ao muito que passei. Fui delegada sindical, defendi os direitos dos meus colegas, não em reuniões bacocas a debitar discursos políticos, mas no local, levando mesmo a uma paralisação numa secção da empresa onde trabalhava. A minha maior lição de vida. Porque se lutei por essas “colegas”, muitas delas são as que hoje passam por mim e fingem que não me viram. Mas tenho outras, que mesmo hoje varrendo as ruas, não deixam de me fazer uma enorme festa, que retribuo com a amizade que lhes devo.
Mas voltemos às pálas. Essas que alguns gostam de ostentar, e que lhes tira até o discernimento para uma discussão. As pálas que sempre me recusei a usar.
E por isso sou capaz de hoje, tanto defender como acusar. De agradecer e apontar o dedo. De aceitar e de recusar. E tenho um enorme orgulho disso a cada dia que passa.
Claro que não é fácil, num tipo de sociedade que só vive de rótulos, de cores políticas, de tendências, de gostos. Mas ser integro e vertical nunca foi fácil.
E nunca o será, enquanto a sociedade for composta na sua maioria por cordeiros.
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