Primeiro que tudo, uma saudação a quem perde algum tempo
para ler o que escrevo, desejando que 2014 traga saúde e felicidade, já que
dinheiro será muito difícil.
Hoje escrevo sobre as pálas. Aquelas que muitas pessoas
colocaram aos 12 ou 13 anos (outros um pouco mais tarde, consoante lhes deu
mais jeito) e das quais não são capazes ou não querem livrar-se.
Se há algo que me irrita é isso. Nasci antes do 25 de
Abril de 1974, e tive a sorte de ser «A Geração de Abril», os meninos que
podiam ir para a escola sem bibe, que podiam pintar cravos e papoilas nos muros
da escola, que podiam dizer a palavra liberdade sem medo.
Fui da juventude que podia ler o que quisesse, numa biblioteca recheada de
livros. Que pôde ler sobre os horrores da PIDE e sobre a vitória de Humberto
Delgado, porque o meu pai, simples pastor/cobrador/estivador conseguiu comprar
esses livros.
Fui do sexo feminino que pôde decidir começar a trabalhar
aos 17 anos, e desde aí nunca mais parar. Pude estudar na Universidade, no
curso que quis.
Fui durante todos esses anos, educada numa família
comunista. Numa família que se calava quando na televisão falava Álvaro Cunhal,
figura que sempre respeitei. Numa família que seguia os resultados das eleições
na sede do PCP da Torre da Marinha (local que alguns que hoje ostentam
cravinhos vermelhos se calhar nem sabem que existiu).
Mas graças a um pai apenas com a 4ª classe e uma mãe que
quase nem sabia assinar o seu nome, aprendi a pensar.
Aprendi a não ficar apenas pelo que ouvia, a indagar, a
olhar o mundo com olhos de ver. Sem pálas.
Claro que essa visão se deve também ao muito que passei.
Fui delegada sindical, defendi os direitos dos meus colegas, não em reuniões
bacocas a debitar discursos políticos, mas no local, levando mesmo a uma
paralisação numa secção da empresa onde trabalhava. A minha maior lição de vida.
Porque se lutei por essas “colegas”, muitas delas são as que hoje passam por
mim e fingem que não me viram. Mas tenho outras, que mesmo hoje varrendo as
ruas, não deixam de me fazer uma enorme festa, que retribuo com a amizade que lhes
devo.
Mas voltemos às pálas. Essas que alguns gostam de
ostentar, e que lhes tira até o discernimento para uma discussão. As pálas que
sempre me recusei a usar.
E por isso sou capaz de hoje, tanto defender como acusar.
De agradecer e apontar o dedo. De aceitar e de recusar. E tenho um enorme orgulho
disso a cada dia que passa.
Claro que não é fácil, num tipo de sociedade que só vive
de rótulos, de cores políticas, de tendências, de gostos. Mas ser integro e vertical nunca
foi fácil.
E nunca o será, enquanto a sociedade for composta na sua maioria por
cordeiros.
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