Era uma noite muito fria, já tarde quando chegámos.
Depois de passar com o carro por um caminho de terra sem muita luz e cheio de buracos, estacionei.
Logo reparámos na quantidade de pessoas que aguardavam junto a um portão, entre a escuridão, em pé, tentando combater o frio daquelas 23h00 como podiam. Conversas não havia, porque não era para isso que ali estavam.
Dirigimo-nos à pessoa que fazia a recepção e perguntamos por uma das voluntárias.
Mandaram-nos subir por outro caminho escuro.
Lá em cima, o ambiente era mais acolhedor, com mais luz, e os voluntários, também cheios de frio porque a exígua cozinha não permitia muita gente lá dentro, brincavam e conversavam no exterior, enquanto arranjavam as caixas de fruta e as demais dádivas que iam recebendo.
A Andreia e eu conversámos com alguns desses voluntários e logo saltava à vista o gosto com que se entregavam a esta missão. A Missão de servir comida a quem dela precisa.
Já passava das 23h00 quando começaram a chegar as primeiras pessoas, vindas do «local de espera» à entrada. Têm de entrar em grupos pequenos, explicaram-nos, porque nem sempre certas comidas chegam para todos e é difícil verem que uns levam certas coisas que já não há para outros.
Algumas das pessoas preferiam manter-se afastadas de nós. Outros queriam era falar das suas histórias. Não era para isso que ali estávamos, mas sim para dar a conhecer a Missão destes voluntários.
O frio apertava debaixo de um telheiro improvisado, mas a conversa continuava, aquecendo assim um pouco a noite.
Uma conversa onde se pedia um milagre para este Natal. Que alguém dê comida que permita à Missão Servir um Sorriso proporcionar uma ceia de Natal às mais de cem famílias que os procuram três vezes por semana.
Outros milagres também se pediam. Um espaço mais condigno, onde as pessoas não tivesse de aguardar ao frio e à chuva sem qualquer protecção ou um simples banco para se sentarem. Uma carrinha onde os voluntários pudessem ir recolher a comida e levá-la aos idosos que não se podem deslocar ali. Mais Voluntários e mais Dádivas.
Depois saímos.
Enquanto fazia a manobra com o carro, disse à Andreia para reparar nos carros que também ali estavam. Um em especial chamou-nos a atenção. Um modelo recente, caro, mas que exibia encostado à roda da frente dois carrinhos de supermercado. Lá dentro, uma mulher e duas crianças. Aguardavam na certa que as “jornalistas” saíssem, para então ir buscar as dádivas que lhes darão sustento durante uns dias.
No carro conversávamos, com a Andreia, na sua primeira grande reportagem, a dizer como tinha ficado chocada e que nunca mais desperdiçaria comida. Para mim, esta não foi a primeira vez que encarei estas histórias.
O que me permitiu também explicar-lhe que é também por isto que o jornalismo é «a melhor e a pior de todas as profissões».
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