quinta-feira, 15 de setembro de 2011

«Isto tem de levar um estouro»


«- Está tudo tão caro! – disse a senhora, que tinha entrado e escutava com ar sombrio a conversa dos homens, parecendo ainda mais alta por causa do seu vestido preto. – Se lhes dissesse quanto paguei pelos ovos... isto tem de dar um estouro.
Os três homens daquela vez foram da mesma opinião.
Falavam revezadamente, em voz condoída, e começaram as lamentações.
Os operários não se podiam aguentar, a Revolução não fizera nada, senão agravar-lhes as misérias, os burgueses é que engordavam desde essa data, sem ao menos deixarem lamber os operários o fundo dos pratos. Digam lá se estes tinham tido quinhão razoável no extraordinário aumento da riqueza e do bem-estar naqueles últimos anos.
Tinham troçado com eles ao declará-los livres, sim, livres de morrerem à fome, do que eles não se privam.
Não era coisa que desse de comer, votar nuns pândegos que comiam depois à tripa-forra, tratando os miseráveis como calçado velho. Nada.
Fosse como fosse, era necessário acabar com aquilo, ou a bem, por meio de leis e da combinação da boa vontade, ou a mal, queimando tudo, matando-se uns aos outros. Havia de ser na vida das crianças, se não fosse na dos velhos, porque não podia continuar assim, tinha de haver uma revolução, a dos operários, uma limpeza que varreria a sociedade de alto a baixo e a construiria com mais asseio e justiça.
- Isto tem de dar um estouro – repetia a mulher.
- Sim, sim – clamavam os três homens – isto tem de dar estouro»

Emílio Zola, Germinal, 1885.

2 comentários:

Anónimo disse...

Maria do Carmo, só uma perguntinha, porque é que mantém aqui a fotomontagem que tão carinhosamente o seu amigo teixeira fez de si?
É bicha que já passou á história...

Maria do Carmo disse...

Caro comentador, e depois perdia-se uma imagem tão bonita e tão ternurenta? Não podia deixar isso acontecer!

Agora mais a sério, apagar a história é dar força aos cobardes e fazer com que a história se repita. Lembra-se do Holocausto?

Cumprimentos